26 de setembro de 2012

A aristocracia e a religião no século XIX

Esta nota refere-se às secção 9 e 10 de O Barão de Lavos (que pode ler aqui e aqui, respetivamente). 

O século XIX em Portugal foi marcado por uma forte rotura com as estruturas sociais e políticas do passado, no seguimento dos ventos liberais que sopravam de França e de Inglaterra. O reconhecimento de que todos os cidadãos eram livres e tinham os mesmos direitos ("liberdade, igualdade e fraternidade") reduziu fortemente o poder do rei e os privilégios das classes sociais mais poderosas, a nobreza e o clero. Os nobres deixaram de ter assento reservado nas Cortes, devendo submeter-se a sufrágio, e clero foi sujeito à extinção das ordens religiosas e à rotura de todas as anteriores ligações com o Estado, que passou a definir-se como secular.

No capítulo 2 de O Barão de Lavos, Abel Botelho, em consonância com o espírito da época, ridiculariza a aristocracia e censura fortemente os religiosos, sobretudos as freiras e frades dos conventos e mosteiros.

A ascendência aristocrática do barão é analisada em detalhe, mas a sua árvore genealógica é descrita como uma "horta heráldica" recheada de "talos", "cepas" e "grelos", onde o barão "garfava por enxertia duplamente bastarda" num "carugento apelido castelhano"a aristocracia é criticada por se limitar a discussões "fúteis e superfluamente ingénuas" sobre títulos e brasões (mas Botelho não deixa de dar também uma alfinetada aos políticos no poder quando diz: "Mas era claro, ao menos. Sabia a gente com quem tratava. Não se tinha inventado ainda a carta de conselho para galardoar alcoviteiros e nobilitar ladrões").
O monge no milheiral, desenho de Rembrandt,1646
Fonte: Wikipedia

Em relação aos religiosos, já na secção seguinte, a crítica é ainda mais forte. Os conventos são descritos como "casas toleradas de prostituição, defendidas pelo lema hipócrita do voto" e os religiosos são apelidados de "efeminados" hipócritas: "os tonsurados, do primeiro cardeal ao derradeiro fâmulo" que "erguiam furtivamente o burel ou a seda na sombra cúmplice dos claustros, e entregavam-se baixando os olhos contritos ante as imagens de Deus". 

Arrasador!

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